sábado, 13 de outubro de 2012

Capítulo I


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Madri/Espanha,1690.

         - Ramirez meu sobrinho, nos meados do percurso da procissão, lá pelas dezenove horas e um quarto, desça pela ladeira dos Relojoeiros, procure não ser visto, e siga direto para o empório. De lá, se enverede pelo corredor e me espere no escritório que tenho uma missão muito importante a lhe oferecer. Está aqui a chave, tome-a.

         - Pois não meu tio Paco, ao pé da letra, farei como o senhor determina.

         - Tenho certeza disso. Agora vá e não comente nada com Almerinda sua mãe, fui claro?
         - Seja feita a sua vontade senhor meu tio.

          Ao beijar-lhe a mão direita, retira-se do colóquio radiante, e ao mesmo tempo orgulhoso, por ter sido o preferido do seu tio na reservada missão que estava por vir.

Paco Sanchez de Pádua, um comerciante muito abastado da Rua San Martinez, nº. 148, esquina com a Calle de la Libertad, alojado  bem no coração de Madri, no ramo de joias e pedras preciosas, com filiais em vários subúrbios da cidade, viuvou ainda cedo. 

         Sua mulher Juanita, de uma beleza que prendia a atenção de todos, tinha tez branca e cabelos negros cintilantes que descia até a região da cintura. Sua estatura era mediana e corpo de forma escultural. Seu timbre de voz era macio, e olhos azuis que resplandecia como um diamante raro; filha única de uma linhagem tradicional madrilense, os Hernandes Rodiro, não resistindo à febre de mais de 40º graus, causada pelo surto de tifo que se abatera sobre a cidade e vilarejos, veio a falecer em seus braços. Ainda em seus últimos suspiros, trocando juras de amor com seu amado esposo, lamentava não lhe ter dado um filho que tanto desejava.   
 
         Beirando agora seus 36 anos, dotado de um porte atlético forte e atraente, ainda arranca suspiros das raparigas das proximidades. Não se veste tradicionalmente como seus parceiros afortunados, embora seus trajes sejam de primeiríssima qualidade, encomendados diretamente de Paris, capital da moda – prefere usá-los em talhes mais esportivos – que lhe permitam mais flexibilidade no andar e no agir. Enquanto os homens, seus contemporâneos, preferem se trajar em caráter mais clássico, e lhe fitam o olhar de maneira desaprovadora, paradoxalmente as raparigas da sociedade madrilense, como garantia de sua aprovação, suspiram ao vê-lo passar. 

         Paco, como era tratado simplesmente pelos amigos, após a morte prematura de Juanita, entrou de cabeça nos negócios internacionais como forma de esquecer o golpe que a vida lhe infligiu, levando ainda no fulgor dos seus 21 anos, a mulher que tanto amou. Seus amigos mais íntimos acreditavam que ele não iria resistir tamanha desventura, por isso não o deixavam sozinho por muito tempo, temendo que num ato de fraqueza, pudesse atentar contra a sua própria vida. Ledo engano, Paco Sanches de Pádua era como essas raras árvores de madeira de lei que não se derruba com poucas machadadas. 

         Seus negócios vão agora desde as pedras e metais nobres, ao latifúndio dentro e fora da Espanha. Sua maior aquisição está localizada nas Américas – mais precisamente na do Sul. Seus empregados – do varredor, passando pelos seus guarda-costas, aos seus ourives, vendedores, intermediários, compradores, enfim, até o mais baixo da hierarquia, lhes são fiéis até a última gota de seus sangues. Sua benevolência se estende a toda prole destes, não lhes deixando faltar alimento nem educação. Os que vão adquirindo maioridade e completando seus estudos regulares, vão sendo integrados nos diversos departamentos dos seus negócios. 

         Católico ao extremo, não perde uma missa aos domingos e feriados e, sempre com a sua pronta e benevolente ajuda às quermesses promovidas pelas paróquias das cercanias. Além de Almerinda Vitrúvio Almandez – sua irmã mais velha, viúva também, há mais dois irmãos que vivem no negócio de manufatura naval bem a uma légua do cais do porto.

         Determinado em estender seus tentáculos pelas Américas, vai agora ao encontro de seu sobrinho Ramirez, que o espera em seu escritório, o qual o julga merecedor dentre outros sete sobrinhos, em por em prática com segurança as suas pretensões além mar.
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